é meio divertido mentir. por exemplo, estou mentindo quando digo tenho mais o que fazer. não tenho! mas me diverte o quanto posso afirmar mentiras na maior cara de pau, apenas como força de expressão, já que não tenho interesse em determinada situação. realmente, tudo são camadas.
tem mentiras que gostamos de contar pra nós mesmos. ou até mesmo mentiras que escolhemos acreditar. recentemente andei pensando na ordem das coisas. em idiomas que são lidos da direita pra esquerda, como árabe. ou de cima pra baixo, como chinês e japonês tradicional. sabe aquele papo do pensamento ser diferente de acordo com o idioma materno? bom, acontece esse determinismo linguístico segundo sapir-whorf já foi refutado — pelo menos na sua forma mais literal, que dizia que se uma língua não tivesse uma palavra ou estrutura, as pessoas simplesmente não tinham esse conceito. juro?
mas ainda existem diferenças que eu considero chocantes! na forma de percepção de coisas muito fundamentais, como o tempo. momento filme a chegada. tem línguas onde o passado é visto como algo à frente, porque é conhecido e visível, enquanto o futuro está atrás, porque é desconhecido. uau! mas talvez meio que tanto faz? de qualquer jeito somos atravessados pela linguagem e é tudo mega complexo. acho que o lacan ia gostar.
por acaso tô lendo um livro, a idiota, da elif batuman, em que uma personagem passa pelo mesmo processo de teoria, descoberta e vai assim mesmo? ela diz que não consegue ignorar totalmente o determinismo linguistico, porque enquanto ela aprende inglês, ela se vê forçada a pensar diferente. no turco, seu idioma materno, tem um sufixo nas palavras, o -mis, que é muito usado em suposições, onde você não estava lá de fato, mas ficou sabendo. é muito usado em contos de fadas, fofocas, historinhas etc. flagras! enfim, essa estrutura que também existe em mais alguns idiomas relativiza tudo o que falamos a experiência subjetiva das pessoas. a gente simplesmente não consegue sair por aí afirmando questões totalmente factuais, mas precisa levar as relações com as pessoas em conta. algo que simplesmente não vem à tona no inglês, sem tradução.
dito tudo isso, queria estudar turco? mentira. mas eu acho todo esse questionamento sobre idiomas e formas de experienciar o mundo toda uma vibe e quero seguir mentindo sobre isso nos meus pensamentos.
falando nisso, ou nada a ver, mas isso nos leva a trend bebês reborn. tava lendo esse texto do floatvibes e… as pessoas estão doidas. com dificuldades reais de desenvolver relacionamentos interpessoais. e paralelamente, a nossa atribuição de pertencimento e significado está cada vez mais atrelada ao consumo.
as bonequinhas labubu não seriam meio que os nossos bebês reborn, de certa perspectiva? pra mim, até certo ponto, tá tudo certo brincar de bonequinha de vez em quando. já passamos pelos sylvanian families, não? até porque, se formos pensar bem, homens tem bonequinhos de super herói e ninguém fala nada. pior: algumas pessoas literalmente tem literalmente bonecos funkos em casa. tem doido pra tudo. lembrando que sou muito inimiga desses bonecos e meu maior pesadelo é aquele vídeo na casa do thiago abravanel onde ele mostra a coleção nefasta dele.
talvez a gente precise sim de alguns amuletos pra atravessar alguns momentos. acredito que em muitas situações delulu is the solulu. enquanto vivermos na república pentecostal da publi de bets, vamos precisar nos descolar da realidade de vez em quando. não culpo as pessoas. somos um pouco vítimas de algumas circunstâncias. não que o meio nos condicione completamente a tomar certas atitudes questionáveis. afinal, tenha uma personalidade? mas cada um lida de um jeito com todos os males da sociedade.
tem uma certa beleza nessa mentirinha. outro dia assisti de novo o filme já feito — mulholland drive, do lynch — no cinema. e é impressionante como esse filme sempre me impressiona. na cena do clube do silêncio eles avisam: no hay banda. tudo é gravado. e mesmo sendo gravado, mesmo a gente conhecendo o truque, toda a aura de espetáculo envolve. metalinguagem alert. e como tudo na arte e até mesmo na vida, como a gente pode se deixar conectar com tanta força por encenações? mas o que seria da vida se a gente não pudesse se encantar com um filme? um roteiro escrito. uma cena dirigida. um faz de conta. talvez até mesmo um story. quem é de verdade sabe quem é de mentira — mas escolher acreditar mesmo assim.
também andei reassistindo alguns episódios da série já feita - how to with john wilson - na hbo? max? hbo max? who knows? di novo? dei parabéns esses dias. [imagina o surto desse setor de marketing — e de todos os outros que existem]. enfim, mais uma vez: metalinguagem. toda a série tem ares de documentário, e a gente passa a acreditar que o john wilson realmente estava andando por aí com uma questão sobre “how to appreciate wine” e deu de cara com a convenção dos obcecados no filme avatar. apenas nerdolas que precisaram inventar uma realidade paralela, baseada em uma historinha, pra suportar o peso da realidade de fato. e anyway, eles não estão fazendo mal a ninguém. erraram? nunca.
e ainda nesse aspecto, penso muito em um outro episódio da mesma série, quando o john wilson precisa fakear uma explosão em uma privada, e rola toda uma crise, porque ele é documentarista. mas até que ponto a série é realmente documental? quando ela ultrapassa o limite da ficção, além, desse momento metalinguístico?
pois é. isso porque eu nem vou poder avançar ainda mais e tocar no assunto da nova temporada de the rehearsal, também produzida pelo nathan filder — uma pessoa que definivamente existe, porque eu ainda não comecei…acreditam? é que eu não quis mentir pra mim mesma, já que eu fico tão obcecada que me encontro em profundo sofrimento ansioso quando a série volta e os episódios vão saindo semanalmente e então, eu preciso me enganar nesse meio tempo, fingindo que eu tenho mais o que fazer. não tenho, fatos.






